Autor: Geraldo Gomes
Essas vozes sussurradas que ferem com palavras a minha
cabeça falam sobre a guerra que sorrateiramente me tomba, falam sobre a verdade
que carrego nos punhos cerrados, trêmulos e inseguros, ensanguentados pelas
correntes pesadas de viver. Sobre a covardia que é não proteger a própria
sombra do sol que queima o peito em carne viva. E falam sobre a paz que o amor
cobra para que nasçam flores na carne viva do peito.
— Ah! A guerra, a verdade, a covardia e o amor!— quem pode sonhar com uma alma tão torturada? Essas vozes, essas que de noite
sussurram profecias de um passado feliz e de um futuro melancólico, essas vozes
são o ápice da minha insensatez. São os fantasmas que circundam um corpo de
âmago cansado de resistir às pequenas e grandes tormentas da vida.
Continuo ouvindo-as, as vozes barulhentas, ecoando
nos cantos escuros da minha mente; a praga da insônia deixa acesas as velas dos
meus olhos e no lampejo de uma madrugada sem lua, encontro-me só. Só, pois que
a noite serena não me traz conforto algum senão as tristezas que os dias
arrastam. Meu corpo arrasta-se em pés que fingem andar mas que seu sonho de voo
é corrompido, e por isso arrastam-se também. A insensatez minha tem paredes
concretas de amor e ódio que o Diabo e Deus desconhecem. Minha insensatez é
minha e eu estou só.
Não há paz no silêncio exterior: há tanta agonia
pelo o que a noite faz calar. Há tanto a ser dito mas a doida Vida fecha a boca
com seus dedos finos e frios, fúnebres. A vida que morre aos poucos aos pés
daquele desacreditado homem, daquela mulher sem fé, da criança que perde a
inocência. Não há amor num coração que pulsa com medo dos espíritos da vida
morrediça, do vulto da morte e da noite e do próprio espírito humano.
O que resta é tão somente a guerra e a covardia que
sobreviver à alvorada, à grande pintura resplandecente do nascimento do dia, à
plenitude que é respirar o ar que rompera o parto da Noite e sopra rebelde e
sereno como se houvesse enfim paz e por um segundo de contentamento se pudesse
acreditar que viver é um gozo constante parece delírio de um vislumbre de
felicidade. Quando o dia surge, e da janela embaçada das íris se vê a revoada
de uma multidão de corvos a tombar com fúria e ferocidade uns nos outros -- é
quando se sabe que as vozes da loucura fantasmagórica da noite tinham a mais
dolorosa razão: viver dá medo e seu sentido é um grande oculto; o Homem é
covarde para enfrentar a Vida e esse é o motivo da guerra mais duradoura do ser
vivente: estar vivo.
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